A árvore que cantava

A árvore que cantava

Era Janeiro, uma daquelas manhãs claras e secas que fazem lembrar velhos montanheses de bigodes gelados e olhos piscos do sol. Nevara. Grandes e densos flocos tinham caído durante toda a noite. Depois, com a chegada do dia, um forte sopro de vento norte limpara o céu. A floresta, que começa atrás da casa e se estende pela montanha, estava completamente adormecida, envolta num grande silêncio gelado. Por entre as árvores estendiam-se sombras azuis. Os pinheiros vergavam sob o peso da neve, pois o vento da madrugada soprara apenas para afastar as nuvens.

Isabel e Gerardo viviam ali, perto do bosque, em casa dos avós. Era uma casinha cinzenta de portadas verdes. Lá longe, na margem gelada da ribeira, ficava a aldeia, que mal se via naquela manhã, bem como o caminho que seguia ao longo dos campos e atravessava a pradaria. Da janela, as duas crianças esforçavam-se por segui-lo com o olhar. Viam-no bem até à primeira curva, onde se encontrava o grande ácer morto há dois anos, que o avô ainda não tinha decidido cortar. Mas, para lá dele, tudo se confundia. Enquanto estavam assim, de nariz colado ao vidro, Isabel e Gerardo viram passar um pássaro, depois outro e depois um bando que se empoleirou na ramada fazendo cair montinhos de neve.

— Estão com frio — disse Isabel. — É preciso dar-lhes sementes ou pão para comerem.

Arranjou alguns grãos e Gerardo abriu a janela.

— Fecha depressa — gritou o avô — que o Inverno vai entrar-nos pela casa dentro!

As crianças puseram-se a rir. Como se o Inverno pudesse entrar numa casa! Isabel atirou os grãos para a vereda que o avô tinha varrido para poder ir buscar lenha. A avó pôs-se a tossir e levantou as tampas redondas do fogão para lá meter um enorme cavaco. Depois de fechada a janela, dois pássaros desceram da latada. Os outros pareciam inquietos mas, ao verem que nada se mexia, voaram também, enquanto alguns desciam do telhado, bem direitos, quase sem baterem as asas.

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